O uso excessivo de redes sociais tem se tornado um problema crescente, e os idosos, que já são um grupo vulnerável a vícios tecnológicos, estão cada vez mais afetados por isso. Um exemplo desse fenômeno é o relato da família de Ester, que, para tentar ajudar a mãe de 74 anos, tomou a drástica decisão de desligar o wi-fi de sua casa. Mas a história não é única, e muitos familiares enfrentam desafios semelhantes. Vamos entender melhor o impacto das redes sociais sobre os idosos, os sinais de dependência digital e como as famílias podem ajudar.
O vício digital na terceira idade
O caso de Ester ilustra uma realidade cada vez mais comum: o vício dos idosos em redes sociais. A mãe de Ester, por exemplo, ficou tão dependente de seu celular que passava o tempo todo conectada ao Facebook e ao TikTok, ao ponto de levar o celular até para o banheiro e dormir com ele embaixo do travesseiro. “Ela está muito viciada: leva o celular para o banheiro, dorme com o celular embaixo do travesseiro, não interage e não deixa a gente chegar perto do telefone dela”, conta Ester, explicando que o comportamento da mãe havia se tornado tão problemático que os filhos chegaram a tirar o chip do celular para interromper o acesso à internet.
Esse comportamento é uma expressão de uma condição conhecida como nomofobia, que descreve o medo excessivo de ficar sem celular. Embora não seja considerada uma doença oficial, a nomofobia é um reflexo de uma relação não saudável com a tecnologia, que pode resultar em problemas como estresse, ansiedade e até depressão, como apontam os estudos da terapeuta ocupacional Renata Maria Santos.
O efeito das redes sociais na saúde mental dos idosos
As redes sociais, como o Facebook e o TikTok, têm um grande poder de atrair a atenção das pessoas, em especial dos idosos, que muitas vezes estão isolados socialmente ou sentem-se excluídos do mundo digital. Isso se torna ainda mais problemático quando o idoso possui algum tipo de transtorno cognitivo, como o declínio mental ou até demência, o que aumenta a vulnerabilidade ao vício digital.
A especialista em gerontologia, Cecília Galetti, explica que o isolamento social e a solidão são fatores que tornam os idosos mais suscetíveis ao comportamento aditivo, o que pode resultar em uma verdadeira “bola de neve”. “Um idoso isolado em casa e deprimido é mais vulnerável a um comportamento aditivo”, afirma Galetti. Essa situação pode ser ainda mais grave quando o idoso começa a cair em golpes ou se vicia em jogos digitais, que se tornam uma fuga para lidar com sentimentos de tristeza ou solidão.
Os perigos do uso excessivo de celulares na idade avançada
A aposentada Maria Aparecida Silva, de 70 anos, relata que, durante a pandemia de Covid-19, o celular se tornou sua única forma de conexão com o mundo exterior. No entanto, o uso excessivo levou a um comportamento compulsivo, como levar o celular para a cama e perder o sono. “Era como se o celular fosse parte de mim, e eu tinha que ficar perto dele o tempo inteiro. Senão, sentia que faltava alguma coisa”, conta Maria, que reconheceu o vício e procurou ajuda.
A explicação para esse tipo de dependência está no funcionamento do cérebro. As redes sociais ativam o “circuito de recompensa” do cérebro, que é o mesmo mecanismo envolvido em dependências como o álcool e as drogas. Para os idosos, esse acesso constante à validação virtual e à busca por recompensas pode desencadear comportamentos impulsivos e um estado psíquico conhecido como hebefrenia, que leva a uma confusão mental e um comportamento similar ao de adolescentes.
Como identificar o vício e ajudar o idoso
Os sinais de dependência digital em idosos incluem um isolamento social, mesmo quando há outras pessoas por perto, e a perda do interesse por atividades cotidianas, como tarefas domésticas. Além disso, a psicóloga Anna Lucia Spear King, fundadora do Instituto Delete, aponta que a nomofobia pode ser uma forma de lidar com transtornos como compulsão, ansiedade ou depressão. O tratamento, portanto, deve ser direcionado à causa subjacente.
As famílias podem ajudar seus entes queridos a combater o vício digital incentivando atividades fora de casa e promovendo uma convivência mais próxima. A aposentada Maria Aparecida conseguiu superar seu vício ao participar de aulas de caratê em um espaço de convivência para idosos, onde ela aprendeu a deixar o celular de lado e se envolver em atividades físicas.
O risco da demência e o celular
Outro fator que agrava o vício digital entre os idosos é a demência, que afeta cerca de 8,5% da população brasileira com 60 anos ou mais. A combinação da perda cognitiva com o uso excessivo do celular pode ser especialmente prejudicial. Os sintomas da demência, como a agressividade e a dificuldade de controlar impulsos, podem ser exacerbados pelo uso constante do celular, como foi o caso da mãe da enfermeira Wany Passos, que foi diagnosticada com Alzheimer.
“A minha mãe ficou tão obcecada com o celular que chegou a criar namorados fictícios e acreditar em tudo o que via nas redes sociais”, conta Wany. Essa confusão entre realidade e virtualidade pode levar os idosos a adotar comportamentos impulsivos e prejudiciais.
Prevenção e cuidados com os idosos no mundo digital
Embora o uso do celular possa ser benéfico para a qualidade de vida dos idosos, proporcionando contato com familiares e amigos, é essencial garantir que o uso seja equilibrado. Os familiares devem ficar atentos aos sinais de dependência digital e, quando necessário, buscar a ajuda de profissionais especializados.
Cursos de letramento digital também podem ser uma excelente opção para proporcionar uma familiaridade maior com a tecnologia, mas de forma segura e controlada. Assim, é possível inserir o idoso no mundo digital sem que ele se torne dependente das redes sociais.
Referência G1