Em meio ao sucesso da DeepSeek, plataforma chinesa de Inteligência Artificial (IA), que afetou o mercado de ações dos gigantes da tecnologia dos Estados Unidos na última segunda-feira (27), o sociólogo especialista em tecnologia da informação, Sérgio Amadeu, afirmou que a alternativa “pode enfrentar” seus concorrentes ocidentais pelos usuários no Brasil.
“Vai ser uma disputa grande. A DeepSeek tem uma grande jornada pela frente, vai depender dos seus próximos passos, se vai conseguir manter um nível de investimento para ser ampliada – porque ainda não tem capital necessário para poder entrar em uma competição global. Depende de como vai evoluir, das inovações que vai propor. Mas obviamente pode ter um avanço muito grande aqui”, avalia Amadeu ao Brasil de Fato.
Segundo o especialista, o sucesso da plataforma chinesa no Brasil pode ocorrer “principalmente se ela aderir às normas de privacidade, se mostrar mais aberta tecnologicamente falando, e fazer parcerias com organizações brasileiras”.
Amadeu afirma que a DeepSeek consegue “sem dúvida nenhuma” enfrentar a Stargate, projeto estadunidense de infraestrutura de IA, em especial porque a China está em um patamar tecnológico “que poucos países têm condições”.
“O Brasil não tem a vocação da China ou não quer realizar uma política pública de se colocar na vanguarda da tecnologia digital. A política do Brasil é de usuário. A China não, Pequim tem uma política de soberania e liderança técnico-científica”, explica.
Para conquistar os usuários brasileiros, a DeepSeek vai precisar se sobrepor às gigantes da tecnologia estadunidenses por mais tempo do que a queda provocada em suas ações nesta semana.
A Nvidia, por exemplo, que inclusive produz microchips necessários nas IAs, despencou mais de 17% no fechamento em Wall Street – a bolsa de valores de Nova Iorque – o equivalente a 589 bilhões de dólares (R$ 3,5 trilhões) em valor de mercado.
“Há um pouco de exagero nessas declarações de que a Nvidia vai acabar e que o império tecnológico estadunidense se dissolveu simplesmente porque um país como a China tem uma empresa capaz de fazer um grande modelo de linguagem que rivaliza com o ChatGPT”, declara.
Na avaliação de Amadeu, tais afirmações sobre o fim da soberania dos EUA sobre a IA “podem ter sido utilizadas para gerar mobilizações e realizações de lucro por parte de especuladores no mercado acionário”.
“É um exagero dizer que a China já tem capacidade de se equiparar na produção de semicondutores de chips com os Estados Unidos, porque não tem. Os EUA ainda tem investimento muito superior, o maior número de modelos são desenvolvidos em seu solo, e há uma vantagem enorme no tratamento e no treinamento dos modelos por eles”, aponta.
Amadeu explica que, apesar do lançamento da DeepSeek, que permite que o usuário use muitas das funcionalidades que seus concorrentes ocidentais, a China “não domina ou produz chips de última geração”.
Ele aponta que o lançamento da DeepSeek mostra a China como competitiva, capaz de desenvolver, manter e aprimorar tecnologias digitais. “[O país] tem uma capacidade tecnológica enorme, detém o maior número de patentes de IA em solo estadunidense e está apostando nos seus talentos para poder avançar na liderança de IA”, analisa.
A DeepSeek afirma ter gaso apenas 5,6 milhões de dólares – cerca de R$33 milhões – para desenvolver seu modelo, uma quantia irrisória comparada aos bilhões investidos por gigantes estadunidenses.
“O que eles conseguiram é mostrar que a eficiência de um modelo de IA não depende apenas do volume de investimento. Mas depende também de técnicas avançadas de otimização, de arquiteturas inovadoras, estratégias de implementação e treinamento aprimoradas”, explica Amadeu.
Contudo ele aponta Pequim “ainda não está na vanguarda da IA”. “A DeepSeek não liquidou os seus concorrentes, e está muito longe disso”, pondera.
Edição: Leandro Melito
