Considerado um dos cientistas mais influentes do mundo na área de inteligência artificial (IA), o professor Anderson Rocha, do Instituto de Computação (IC), abriu com um alerta o seminário Perspectivas da IA Generativa (IAG) para a Unicamp, organizado pela Diretoria Executiva de Tecnologia da Informação e Comunicação (Detic) e realizado nesta quinta-feira (28).
“A IA não é simplesmente uma ferramenta. Ela é diferente, por exemplo, de um canivete suíço. A IA é inerentemente política”, advertiu o professor diante uma plateia de especialistas, estudantes e servidores que lotou o Centro de Convenções da Universidade e discutiu, ao longo do dia, as implicações da tecnologia no ensino, na pesquisa e na gestão da Unicamp.
“E é política porque afeta a nossa vida diretamente. Ela modifica nossas escolhas, limita nossas escolhas e, às vezes, nem nos deixa fazer escolhas”, afirmou o professor, coordenador do Laboratório de Inteligência Artificial Recod.ai, do IC, que reúne 330 especialistas do mundo todo e é o maior laboratório desse tipo em uma universidade da América Latina. “E quando você tem essas dinâmicas, que afetam o poder, as escolhas, a democracia, é sinal de que temos uma importante discussão a fazer.”
Subárea da inteligência artificial, a IAG volta-se para a criação de novos conteúdos, como textos e imagens, por meio de modelos de aprendizado de máquina que utilizam padrões extraídos de dados já existentes.
O seminário contou ainda com a presença da multiartista Zaika dos Santos, fundadora da empresa de inovação Afrofuturismo Arte e Stem, que combina tecnologias emergentes com ciências de dados, saberes das áreas de humanas e exatas e o fazer de peças de arte e design por meio da IAG.
Cantora, compositora, arte-educadora, artista visual e pesquisadora negra, Santos disse tentar unir as novas tecnologias a elementos ancestrais e, a partir disso, promover transformações sociais e a inclusão das populações negras.
A cantora afirmou transitar por diferentes áreas. “Eu não vou escolher entre humanas, exatas, biológicas. Atuo no entrecampo”, afirmou. “Sem tener para a tecnofobia ou para a tecnoutopia, ser entre”, acrescentou, citando o livro de Lúcia Santaella A inteligência artificial é inteligente?.
O seminário debateu ainda temas como o uso de IA generativa na sala de aula, as experiências de ensino de computação com IA, as oportunidades e os desafios da IA em publicações científicas, os impactos da IA na gestão e administração pública e o uso da IA para a assistência à saúde.
Primeiro passo
O diretor da Detic, Ricardo Dahab, disse que o seminário sobre a IAG representa apenas o primeiro de uma série de debates sobre o assunto. “Este é o primeiro passo na nossa jornada de conhecimento sobre esse admirável mundo novo. E esperamos que não seja [um admirável mundo novo] no sentido da obra de Aldous Huxley”, afirmou.
A pro-reitora de Pós-Graduação, Rachel Meneguello, lembrou que a IA tem potencial para transformar a sociedade, melhorar muitos aspectos da vida das pessoas e impulsionar o desenvolvimento econômico. Meneguello, no entanto, disse estar preocupada. “O lado que nos preocupa é o aspecto da criação. Da criatividade. O [aspecto] do pensamento original.”
O pró-reitor de Graduação, Ivan Toro, lembrou que a IAG pode alterar de maneira significativa a forma como os cursos são ministrados nas instituições de ensino e a experiência de aprendizado dos estudantes. E fez um alerta. “Os professores devem usar essa ferramenta de forma transparente, responsável e ética, garantindo a proteção de dados e a equidade no acesso.”
A pró-reitora de Pesquisa, Ana Fratini, falou sobre a importância do debate em torno da IA. “Este é um momento crucial. Devemos discutir sobre tudo o que há de bom nessa nova tecnologia, mas também sobre tudo o que pode haver de ruim”, afirmou. “Porque tudo o que se cria para o bem pode ser usado para o mal.”
O reitor da Unicamp, Antonio José de Almeida Meirelles – que participou da cerimônia de abertura do seminário –, disse ser um otimista. Para Meirelles, dilemas sobre o uso adequado ou inadequado de novas tecnologias fazem parte da trajetória humana.
“A história da humanidade mostra que, de alguma maneira, conseguimos fazer com que os benefícios predominem sobre os potenciais prejuízos”, argumentou. “A melhor forma de a gente lidar com isso é enfrentar o problema de forma positiva e conseguir inserir a ética e os valores civilizatórios no uso dessas tecnologias.”