Rayssa Leal pega o celular dado pela organização e faz uma selfie com as colegas de pódio na segunda-feira (28). Seria uma cena banal em se tratando de adolescentes, não fosse o fato de que os atletas olímpicos sempre foram proibidos de fazer imagens na cerimônia de premiação. A brasileira, bronze no skate street, não quebrou a regra, porém. A selfie foi permitida porque faz parte de uma ação comercial sem precedente na história olímpica. Com o celular da patrocinadora de Paris-2024 pode.
A Samsung, que banca uma das cotas de patrocínio master do Comitê Olímpico Internacional, distribuiu 17 mil celulares aos atletas participantes dos Jogos como parte de um kit que inclui, entre outros, chip e um Navigo, o equivalente parisiense do Bilhete Único.
No pódio, após a distribuição de medalhas e a execução do hino do país do vencedor, um outro aparelho é dado aos atletas para que “eternizem” o momento, segundo a agência francesa responsável pela criação da campanha. Eles precisam ainda entrar em um aplicativo para ter acesso às imagens que tiraram.
O tortuoso caminho serve para driblar as rígidas regras do COI sobre o uso de mídias sociais impostas aos atletas desde o início da década passada. O intuito da chamada regra 40 é justamente preservar o interesse dos patrocinadores do movimento olímpico. A regulação gerou muita polêmica à época, pois deixava os atletas quase sem espaço para promoção de suas imagens e apoiadores pessoais. A regra acabou sendo relaxada em alguns pontos, mas continua exercendo forte controle sobre os atletas, notadamente no ambiente olímpico.
A última versão do documento, do fim do ano passado, deixa claro que os esportistas não podem fazer imagens durante as competições, por exemplo, ou de colegas sem permissão. É explícito também o veto à produção de imagens “recebendo medalhas”. A ação da fabricante dribla o manual ao fornecer um celular não pessoal, e só após a premiação.
Paris-2024
Um guia diário com o que rolou e vai rolar nos Jogos Olímpicos na França
Na prática, introduz no pódio olímpico um merchandising, algo inédito na história olímpica, que sempre se notabilizou por um estrito cuidado com a imagem dos Jogos. Diferentemente da Fifa, por exemplo, que comercializa diversos espaços publicitários na Copa do Mundo, as Olimpíadas têm transmissões limpas, sem nenhuma marca que não a do próprio evento.
Procurado para comentar o assunto, o COI minimizou a questão, dizendo que nenhuma regra está sendo quebrada pela patrocinadora. “É uma ativação.”
Em Munique-1972, o americano Mark Spitz, recordista em medalhas na natação até o surgimento de Michael Phelps, subiu descalço no pódio dos 200 m livre. Carregava os tênis Adidas nas mãos e foi advertido pelo comitê.
Meio século depois, o roteiro da Cerimônia de Abertura inclui referência ao game Assassin’s Creed e uma cena dentro de uma oficina da Louis Vuitton, patrocinadora master dos Jogos.
No sábado (27), na prova de contra o relógio do ciclismo, os vencedores receberam o celular para fazer o registro histórico. Não conseguiram lidar com o aparelho dado pela organização e, de brincadeira, fizeram menção de jogá-lo no rio Sena. A curiosa cena já pertence aos anais olímpicos.
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